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Commercial notes take the place of banknotes*

Estoque de títulos atingiu R$ 111 bilhões neste ano, ante R$ 40 bilhões em 2021; isenção de IOF e entrada de empresas limitadas explicam alta

 

Freitas: “As notas comerciais vão ‘engolir’ parte das CCBs, haverá uma substituição natural”

Em um cenário de juros altos, que eleva a demanda por papéis de renda fixa e torna o crédito mais restritivo, as emissões de notas comerciais têm aumentado. O volume desses títulos de dívida corporativa emitido em 2024 chegou a R$ 77 bilhões, um aumento de 64% em relação ao ano anterior, segundo dados da B3. O estoque das emissões atingiu neste ano em R$ 111 bilhões – ante R$ 40 bilhões em 2021.

O crescimento veio na esteira de um ajuste na legislação, há quatro anos. A mudança, entre outros pontos, levou o acesso desses títulos para as empresas limitadas. “Isso fez com que o produto mudasse de patamar”, afirma o superintendente de produtos de balcão da B3, Leonardo Betanho.

Outra alteração relevante, feita no contexto da pandemia de covid-19, foi que a nota comercial passou a ser escritural e não mais física, ajudando a desburocratizar o produto.

Desde então, os papéis estão substituindo as cédulas de crédito bancário (CCBs), tradicional veículo para empréstimos na carteira dos bancos.

A migração tem ocorrido, em grande parte, por uma questão tributária. A CCB é um título de crédito bancário, e portanto passível de cobrança de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Enquanto isso, nas notas comerciais não há incidência desse imposto porque são consideradas um valor mobiliário.

As notas comerciais passaram a atender um público que antes não estava sendo atendido”

— Luis Filipe Gentil

Com a abertura das emissões por empresas limitadas, o perímetro de companhias que podem captar recursos usando notas comerciais cresceu substancialmente. “Isso representa uma revolução no acesso ao mercado de capitais por parte de empresas que tradicionalmente não emitiam títulos públicos, ou seja, empresas de médio porte, muitas vezes familiares, com bons fundamentos, mas fora do radar do mercado tradicional”, diz o responsável pela coordenação e distribuição de ofertas públicas da Bloxs, Matheus Fonseca.

Bruno Tuca, sócio da área de mercado de capitais do Mattos Filho, diz que a nota comercial permite que empresas limitadas emitam um título de dívida semelhante às debêntures, permitidas apenas para as sociedades de ações. Até então, o único acesso das limitadas ao mercado de capitais se dava por meio dos certificados de recebíveis agrícolas e imobiliários (CRAs e CRIs).

Se a decisão do governo de aumentar o IOF de operações de crédito a pessoa jurídica for mantida, a expectativa é que o apelo das notas comerciais cresça ainda mais. “As notas comerciais vão engolir parte relevante das CCBs, haverá uma substituição natural”, afirma o presidente da Oliveira Trust, José Alexandre Freitas. Segundo o executivo, desde o anúncio os questionamentos de empresas que tinham no CCB a principal fonte de financiamento cresceram, com a atenção agora voltada às notas.

Tuca, do Mattos Filho, diz que além do aumento do IOF sobre os títulos bancários, as restrições impostas à emissão de CRIs e CRAs, que diminuíram as possibilidades de lastro para esses títulos, serão outra via de crescimento para as notas comerciais.

“Com isso, as empresas limitadas terão como alternativa as notas comerciais”, diz. Ou seja, o papel deverá ser ainda mais acessado por esse grupo.

Esses títulos são, no geral, emitidos por pequenas e médias empresas e têm, na maioria um valor que gira entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões. São registradas, contudo, emissões maiores, algumas raras já se aproximando de R$ 1 bilhão. Os recursos captados costumam ser usados para capital de giro, segundo Freitas.

“As notas comerciais passaram a atender um público que antes não estava sendo atendido”, afirma o sócio da área de mercado de capitais do escritório Machado Meyer Luis Filipe Gentil.

A maior procura das notas comerciais pelas empresas também se deu sob o contexto de um crescimento rápido do mercado de Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDCs), que se tornaram importantes compradores de notas comerciais, especialmente aquelas privadas, que podem ser vendidas sem esforços de venda, no geral ficando com poucos investidores. Outros fundos de crédito e até mesmo fundos de pensão também são compradores desses papéis, segundo especialistas.

Segundo Ricardo Prado, sócio da área de mercado de capitais do Lefosse, desde a mudança da lei em 2021 se criou um instrumento adicional de financiamento das companhias, que vem crescendo à medida que se torna mais conhecido. Atualmente, lembra, esses títulos são muito parecidos com as debêntures. A diferença é que estas têm liquidez no mercado secundário, algo que acaba sendo fundamental para emissões maiores e de vencimento mais longo. Há, ainda, o benefício fiscal no caso das debêntures incentivadas.

Antes, as notas comerciais tinham como vantagem a celeridade, já que não era necessário fazer a escritura da emissão na Junta Comercial. Por isso, era comum que grandes empresas acessassem o papel como um empréstimo-ponte para uma emissão de debênture. No entanto, recentemente, essa exigência para as debêntures foi flexibilizada.

As notas comerciais são emitidas principalmente pelos bancos menores e algumas butiques que fazem emissões de produtos de renda fixa. Parte dos grandes bancos acaba mantendo a atuação mais voltada às ofertas públicas, ou seja, as distribuídas ao mercado e que, por isso, tendem a ser mais líquidas. Segundo uma fonte de um grande banco, existe ainda a percepção de maior risco desses títulos e ainda o questionamento de que, nas emissões privadas se trata, à risca, de um título de valor mobiliário.

Algumas instituições financeiras, por isso, decidiram por enquanto apenas emitir as notas públicas e, dependendo do cliente que opta por uma emissão privada, o banco pode apoiá-lo sendo um investidor do papel.