Itaú, Liqi e Oliveira Trust fazem fundo de recebíveis ‘tokenizado’
Em vez de ser estruturado com registro em blockchain das cotas de um FIDC tradicional, produto foi desenvolvido com arquitetura totalmente ‘tokenizada’
Por Ricardo Bomfim
Valor Econômico | Outubro 2023
O Itaú, a tokenizadora Liqi e a empresa de serviços fiduciários Oliveira Trust fizeram um TIDC (sigla para Token de Investimento em Direitos Creditórios) de R$ 20 milhões. Em vez de ser estruturado com o registro em blockchain das cotas de um Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) tradicional, o produto foi desenvolvido com uma arquitetura totalmente “tokenizada” e representa a primeira iniciativa tornada pública da Itaú Digital Assets desde que o banco começou a participar do projeto piloto do real digital (Drex).
Segundo Guto Antunes, responsável pela Itaú Digital Assets, o projeto do TIDC foi iniciado paralelamente às primeiras proposições do Drex e desenvolvido de modo que se encaixasse na infraestrutura da versão tokenizada da moeda brasileira quando esta estiver oficialmente em circulação. “O Itaú não parou de tokenizar. Usamos a nossa tokenizadora para fazer parcerias com empresas como a Liqi e vemos vários casos interessantes em blockchain”, diz.
Na operação do TIDC, a SB Créditos origina os recebíveis e os envia para a Oliveira Trust, que checa e escritura os ativos, garantindo que a propriedade deles esteja vinculada ao token no qual serão registrados. Em seguida, a Liqi entra no negócio registrando esses ativos no blockchain Gnosis como tokens não fungíveis (NFT), com todas as regras de liquidação. Na sequência, o criptoativo vai para a carteira da SB Créditos, que o cede ao TIDC estruturado pelo Itaú BBA para que o Itaú Unibanco entre como investidor dos tokens seniores. A aquisição dos recebíveis para o fundo é feita com o uso de uma “stablecoin” – moeda digital registrada em blockchain e atrelada ao valor de uma divisa soberana tradicional, tal qual o real ou o dólar – proprietária do projeto e depende de condições programadas nos contratos inteligentes que regem o TIDC. Por fim, a assessoria jurídica foi feita pelo VBSO, escritório que deu a ideia do produto e assessorou a estruturação.
“Tudo é on-chain. O TIDC muda a infraestrutura do mercado de capitais, porque não é como contratar com as mesmas regras e trâmites de um FIDC tradicional e depois tokenizar a cota. Ele cria uma nova infraestrutura mais eficiente e mais barata, que se conecta com o Drex como câmara de tokenização”, afirma Daniel Coquieri, CEO da Liqi.
O fundo tem um prazo de três anos e conta com a entrada de novos créditos revolventes de acordo com o modelo explicado acima. Por ser um instrumento novo e com uma infraestrutura diferente da utilizada pelo mercado de capitais atualmente, foi lançado em uma operação fechada que teve apenas o Itaú como investidor sênior. “Não teve esforço de venda, pois fizemos o que a CVM [Comissão de Valores Mobiliários] permite que seja feito. Pedimos na CVM para fazer a oferta pública. Eles veem isso como evolução do mercado de capitais, mas precisam saber como regular esse tipo de oferta”, explica Caio Viggiano, diretor de renda fixa do Itaú BBA.
Viggiano diz que, com as regras atuais, esse tipo de produto financeiro só pode ser ofertado a poucos investidores profissionais, aqueles que têm mais de R$ 10 milhões em aplicações financeiras. Coquieri espera que o lançamento do TIDC pressione os reguladores a criarem regras que democratizem o acesso a investimentos construídos com infraestruturas tecnológicas similares. “De largada, a estrutura foi 60% mais barata do que a de uma operação de FIDC tradicional”, afirma Coquieri. “Tem demanda, tem mercado e tem valor, de modo que o regulador precisa continuar se mexendo para viabilizar.”
José Alexandre Freitas, CEO da Oliveira Trust, destaca que o FIDC, além de ter um arcabouço legal mais complexo, também tem regras e custos maiores. “No TIDC, as parcelas relevantes vão para o blockchain, reduzindo os custos da atividade, tornando-se um produto fantástico para captação”, defende. O executivo acredita que a redução dos custos permitirá que o acesso a fundos de recebíveis aumente quando o modelo for disseminado.